quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Jornalista afirma que crianças francesas não fazem manha e faz sucesso com livros


Pamela Druckerman acaba de lançar 'Crianças francesas dia a dia' em que dá dicas pontuais de como criar filhos à francesa

Juliana Contaifer - Especial para a Revista do Correio
Ser francesa está na moda. Elas não engordam, vestem-se bem, são chiques e elegantes o ano todo. E, agora, descobriu-se que são ótimas mães — ainda que essa afirmação não possa ser considerada uma unanimidade. Mas não se iluda, elas passam bem longe do modelo de educação convencional. Foi o que a jornalista americana Pamela Druckerman percebeu quando se mudou para Paris e descobriu que estava grávida. Criando suas filhas como foi criada, percebeu que só ela estava surtando com a maternidade, consultando milhões de sites, fazendo uma dieta especial e se entupindo de vitaminas. Com as crianças maiores, reparou que apenas elas se recusavam a comer, faziam grandes escândalos no meio da rua. Além disso, Pamela era a única mãe a ficar do lado do escorregador com medo de os filhos se machucarem. Foi pesquisando como as mães francesas criavam pequenas miniaturas independentes que a jornalista escreveu o primeiro livro, 'Crianças francesas não fazem manha'. Em abril deste ano, a sequência, 'Crianças francesas dia a dia', foi publicada no Brasil, dessa vez com dicas pontuais de como criar filhos à francesa.

Charlotte com a filha, Louise: 'Eu crio minha filha para voar com as próprias asas, ser independente' (Zuleika de Souza/CB/D.A Press)
Charlotte com a filha, Louise: "Eu crio minha filha para voar com as próprias asas, ser independente"
“Algumas ideias francesas têm um poder e uma elegância únicos. Os pais franceses acreditam de verdade que os bebês são racionais, que você deve combinar um pouco de rigidez com muita liberdade e que se deve ouvir as crianças com atenção, mas não fazer tudo o que elas dizem”, afirma Pamela no primeiro livro. A jornalista conta que o principal segredo é que as francesas não mudam completamente suas vidas ao se descobrirem grávidas. É a criança que deve se adaptar à rotina dos adultos — tanto é que elas viajam sozinhas com a escola, passam pelo menos um mês na casa dos avós durante as férias e, depois de um 1 de idade, já passam a comer o mesmo que os pais.

“A visão da maternidade aqui no Brasil é uma coisa sofrida, e a sociedade exige que ela seja. Exige que você se dedique 100% do tempo, que não faça outras coisas, que abdique da sua independência e personalidade. Talvez aqui as pessoas tenham essa expectativa, mas nós não lidamos da mesma maneira. Acho que levamos a maternidade com mais leveza”, analisa Charlotte, uma francesa que mora no Brasil.

As francesas acreditam que as crianças devem ser independentes, e o mais cedo possível. É por isso que elas só se levantam de madrugada para consolar o filho depois de pelo menos 15 minutos de choro. Se elas estão ao telefone e a criança quer falar, ele escuta da mãe que deve esperar a ligação terminar. No parquinho, as mães ficam conversando a distância, enquanto os filhos brincam e aprendem a cair e a se levantar. As crianças também aprendem a conviver com o tédio — nada de muitas atividades durante o dia, elas devem aprender a preencher o próprio tempo sozinhas e são estimuladas a inventar brincadeiras.

Charlotte mora com o marido brasileiro e a filha, Louise, de 4 anos. Ela conheceu o marido quando veio ao Brasil estudar e trabalhar, casaram-se e moraram na França por dois anos. Ela conta que a criação francesa é, de fato, muito diferente da brasileira. “Eu tenho a impressão que os brasileiros criam os filhos para eles mesmos, e eu crio minha filha para voar com as próprias asas, ser independente. Espero que ela não precise muito de mim”, explica. Charlotte conta que sua visão da educação é bem mais rígida do que a do marido, que é brasileiro, mas que os dois conversam muito para chegar a um meio-termo. “São duas culturas, temos que conversar bastante para chegar a um consenso. Mas ele já morou lá e entende que temos uma visão mais independente”, conta.

Louise é realmente independente, apesar de ter, sim, seus momentos de birra como qualquer outra criança. “Ela é boa de garfo, nunca tive que fazer muito esforço para ela comer. Só que ela come o mesmo que nós desde os 2 anos de idade. Se Louise não quiser comer, come melhor em outra refeição. A gastronomia e a culinária na França são muito importantes, e a gente acaba passando esses valores inconscientemente. Para nós, o momento da comida é de prazer, e não de batalha”, afirma. E, diferentemente dos brasileiros, desde os 4 meses a pequena faz apenas quatro refeições por dia — nada de pequenos lanches fora de hora.

Julie lembra que já foi criticada várias vezes na rua por conta da educação que dá a Ananda e Flora (Zuleika de Souza/CB/D.A Press)
Julie lembra que já foi criticada várias vezes na rua por conta da educação que dá a Ananda e Flora
Para Charlotte, as crianças francesas crescem menos dependentes dos pais, tanto moral quanto fisicamente — é por isso que quase não se vê demonstrações públicas de afeto nas ruas francesas. “Damos carinho também, somos pais e beijamos os filhos, mas não hesitamos em dar bronca e dizer não. Somos um pouco mais rígidos para dar estrutura alimentar, emocional e intelectual, colocando limites, para criar um adulto equilibrado. Acho que isso é educação”, conta.

A professora Julie Vuillermoz, 33 anos, também é francesa e mora no Brasil há cinco anos. Tem duas filhas pequenas: Ananda, de 4 anos, e Flora, de 1 ano e meio. Para a professora, a maior diferença entre a educação francesa e a brasileira é que, realmente, as crianças da França são mais independentes. “Sou muito mais tranquila na hora de cuidar, deixo elas chorarem para dormir, não fico embalando e não forço para comer. Na educação francesa, entendemos que as crianças são indivíduos à parte, que podem escolher seus próprios caminhos com algumas indicações dos pais. Acho que confiamos mais neles”, conta. Julie explica que, na França, ao completar 18 anos, espera-se que os filhos saiam de casa, e os pais não hesitam em usar o antigo quarto das crianças para outros fins.

A professora acredita que uma das principais diferenças é que as mães brasileiras colocam os filhos em posição de adulto muito cedo. “Desde os 3 anos, as crianças têm um monte de atividades, pilhas de dever de casa e nenhum tempo para ser criança. Nós respeitamos melhor as etapas da vida.”

Charlotte e Julie contam que, se é difícil criar filhos, educar uma criança francesa no Brasil, então, é duas vezes mais complicado. “As pessoas me olham estranho na rua, há uma reprovação muito forte da sociedade. Tão forte que pessoas desconhecidas me param para dar palpites de como eu deveria criar minha filha”, afirma Charlotte. “Um dia desses, levei uma bronca de uma senhora porque minha filha deixou cair um pastel no chão e pegou de volta. Sempre alguém reclama que ela está sem meia, tanto que comprei um monte e, agora, ela vai de meia para todos os lugares”, conta Julie.

É difícil implementar um tipo de educação como o francês na sociedade brasileira, que é notadamente mais carinhosa e afetiva. “A educação brasileira também tem coisas boas, claro. Aqui, as famílias se dão bem, os filhos adultos são amigos dos pais e os idosos têm mais atenção. Elas podem contar umas com as outras”, afirma Charlotte. A conclusão é que não existe nenhum tipo de receita de criação exemplar que seja muito melhor do que as outras. O melhor é juntar dicas de vários lugares e misturar com uma boa dose de intuição materna.

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